É preciso repensar e redesenhar o modelo das Universidades Brasileiras
Wanda Marisa Gomes Siqueira*
A sociedade tem que cobrar eficiência das universidades brasileiras e convocá-las para um grande debate se quiser formar cidadãos honestos, competentes e responsáveis pelos destinos de nosso país.
Na 1ª Conferência Nacional de Educação realizada em Brasília foi apresentada proposta de criação de uma espécie de agência reguladora da educação com o objetivo de zelar por mais qualidade no ensino, com ênfase na qualidade do ensino superior.
A transformação pretendida na proposta exige mudanças necessárias e significativas na Constituição Federal, especialmente em relação à autonomia universitária. É notório que a autonomia universitária sempre foi mal interpretada e, não raras vezes, tem sido utilizada como passaporte para atos insindicáveis no âmbito das universidades. Cita-se como exemplo vícios e fraudes nos concursos vestibulares, nos concursos públicos para ingresso no magistério superior, nos processos de jubilamento de alunos, nos ingressos extra-vestibulares, nas contratações sem concurso e - mais grave ainda - na tentativa de engessamento do Poder Judiciário.
Para que as propostas de mudanças sejam colocadas em prática é indispensável que o debate ganhe importância nos meios de comunicação para motivar a sociedade e, assim, fazer com que pensemos em educação com seriedade – única forma de tirar o país do caos em que se encontra.
Sabe-se que as universidades estão impregnadas de corporativismo e privilégios internos que emperram seu bom funcionamento e que o tamanho e a estrutura dessas instituições estão a exigir que seu modelo seja redesenhado para que possam sair da crise e do descrédito em que se encontram. Todos sabem que os cofres públicos são sugados pelas universidades, com o excesso de professores e o grande número de evasão de alunos (se comparado com as universidades européias e americanas), todavia, poucos ousam denunciar esses abusos.
É de lamentar que aqueles que têm o poder/dever de moralizar as universidades não o façam porque gozam de privilégios que vão desde contratações sem concurso público até a coordenação e realização de cursos de pós-graduação no exterior, com afronta aos princípios do mérito e da isonomia.
O tabu do silêncio deve ser quebrado para que os desacertos de décadas possam ser debatidos e avaliados pela sociedade, sem dispensar a valiosa participação dos egressos das universidades que se encontram inseridos e até mesmo dos excluídos do mercado de trabalho.
A avaliação e o controle externo são medidas salutares que podem e devem ser adotadas para que o modelo de universidade que o Brasil merece - e necessita - possa ser discutido com a colaboração da sociedade de forma democrática.
Sabe-se que dentro das universidades existem ilhas isoladas sem que seus onipotentes habitantes se comuniquem. As frágeis pontes que interligavam essas ilhas estão cercadas de fogueiras de vaidade ou se romperam, sem que ninguém deseje ou ouse reconstruí-las - essa é a dura e cruel realidade que precisa ser desnudada.
Ao contrário do que se espera e necessita, é forçoso reconhecer que a estrutura interna acentua privilégios e desvirtua o verdadeiro sentido da universidade, enquanto os recursos dos administrados se perdem nos incontáveis departamentos, nas câmaras, nos conselhos, nas pró-reitorias, nas procuradorias e nas reitorias - não raras vezes sem solução.
É necessário reconhecer que enquanto a sociedade estiver acomodada a universidade continuará, à sombra da autonomia, existindo para perpetuar privilégios e para sugar os cofres públicos sem se preocupar com a boa formação dos estudantes e muito menos em respeitar os princípios ínsitos no artigo 37 da Constituição Federal: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.
Se os brasileiros quiserem ter bons professores, bons médicos, bons engenheiros, bons políticos, bons cientistas e bons profissionais em todas as áreas do saber precisa exercer controle sobre o fazer da universidade e exigir que ela cumpra seu verdadeiro papel com seriedade e eficiência.
A USP, por exemplo, tem 80 mil alunos e 30 mil funcionários, mas não sabemos o custo das universidades para os cofres do país.
É preciso repensar e redesenhar o modelo das universidades brasileiras, para tanto, é necessário que a educação passe a ser considerada como um bem público com metas objetivas e rigorosa fiscalização a ser feita pela sociedade civil organizada e, quando necessário, pelo Ministério Público e pelo Poder Judiciário, sem intervencionismo mas com muita responsabilidade para que os estudantes brasileiros não fiquem à mercê dos atos de abuso de poder dos agentes das universidades públicas e dos empresários do ensino.
Lembro lições do saudoso professor Darcy Ribeiro: “Fracassei em tudo o que tentei na vida. Tentei alfabetizar as crianças brasileiras e não consegui. Tentei fazer uma universidade séria e fracassei. Tentei fazer o Brasil se desenvolver autonomamente e fracassei. Eu detestaria estar no lugar de quem me venceu. Ensinou ainda”: Só há duas opções nesta vida: Se resignar ou se indignar. Eu não vou me resignar nunca”.
Como Darcy Ribeiro eu não vou me resignar nunca e não admito fracassar na luta pela aprimoramento das universidades, até porque aceitar a idéia de fracasso seria admitir que fracassou também o Poder Judiciário, instituição respeitável, onde deságuam todos os anseios daqueles que têm seus direitos violados.
*advogada
Maio 2010
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